quarta-feira, 30 de julho de 2014

AINDA SOBRE O MASSACRE NA PALESTINA.

Cineasta israelense faz documentário sobre caráter de teste de armas nos bombardeios sobre Gaza
Armas letais alvejaram quase exclusivamente civis, entre os quais 150 crianças

"The Lab",  documentário do diretor Yotam Feldman, produzido para o Canal 8 de Israel, explica toda a ensandecida ofensiva sobre a população de Gaza: "a cada operação militar, novas armas são testadas, gerando um aumento direto das vendas no mercado internacional. Após cada guerra, na qual são testadas novas armas, as vendas dessas armas aumentam e os lucros são muito grandes",conclui o cineasta de 32 anos, que levou 3 anos e meio na produção do filme de 58 minutos: "a prosperidade da economia israelense não ocorre apesar das guerras, mas sim, em grande parte, em decorrência das guerras. Na minha pesquisa descobri que, do ponto de vista econômico, as guerras não são uma carga, mas uma fonte de lucro”.

Para entender esses bombardeios que podem configurar crimes de guerra, segundo o Conselho de Direitos Humanos da ONU, há que ir fundo na investigação do peso da indústria bélica israelense, que hoje responde por 25% de suas exportações e está num crescente tão expressivo, que já ultrapassa a França, quarta maior vendedora de armas do mundo, atrás dos Estados Unidos, Rússia e Alemanha.

Hoje em dia as vendas do setor bélico são calculadas em 9 bilhões de dólares, o que representa cerca de 25% do total das exportações israelenses. Isso sem falar  num Exército regular de 161mil  e 500 soldados,  com gastos militares de U$ 9,4 bilhões anuais (US $ 1.499, por habitante) igual ao Brasil, que com seus 287 mil e 600 efetivos, consumia US $ 9,6 bilhões anuais, numa relação de US $ 55 por habitante, segundo números do International Institute for Strategic Studies. 

De acordo com Ehud Barak, ministro da Defesa de 2007 a 2013, cerca de 150.000 famílias em Israel (quase 1 milhão dos 8 milhões de habitantes) se sustentam da indústria militar. "De certa forma, toda a sociedade israelense sai ganhando com a exportação militar, que, por sua vez, ganha credibilidade com os testes realizados nas guerras", afirma Feldman, que também menciona o fato de muitos dos fundos de pensão no país investirem nas ações sólidas da indústria de armamento.

Os mesmos impulsos em 
busca do "espaço vital"

Numa configuração que compromete toda a heróica história do povo judeu, o Estado de Israel vive os mesmos impulsos da Alemanha nazista na busca do seu "espaço vital". Seus "falcões" não escondem tais objetivos quando se lançam na expansão dos  assentamentos na Cisjordânia, em território que seria palestino, e na construção de cidades paralelas onde árabes-israelenses vivem, como Nazareth, junto ao Mar da Galileia. Um muro que já tem 70 quilômetros de extensão deve chegar a 800, abrangendo uma área ainda maior do que a do Estado de Israel, hoje.

Avigdor Lieberman quer
limpeza étnica em Gaza
As operações militares que alvejam quase exclusivamente civis palestinos não acontecem por acaso. Consolidar a expansão e destruir totalmente o sistema administrativo de Gaza incluem-se nessa estratégia, como deixou claro o ex-chanceler e líder da ultra-direita israelense Avigdor Lieberman, ao defender a “reconquista” da Faixa de Gaza para fazer  uma “limpeza”.

"Não há outra escolha e o Estado de Israel deveria seriamente considerar a possibilidade de reconquistar toda a faixa e organizar uma limpeza de verdade”, afirmou em junho em entrevista à rádio  Voice of Israel"A longo prazo, não haverá escolha, a não ser tomar alguma ação", disse o líder do Ysrael Beiteinu (Israel é nosso lar), partido coligado ao Likud, formado em sua maioria por migrantes vindos da Rússia e Europa Oriental.

Em Israel, vozes influentes se levantam
 contra o expansionismo bélico

A expansão na direção de um espaço vital ampliado é condenada por uma fração cada vez maior da população israelense e de judeus pacifistas espalhados pelo mundo. Um conhecido especialista acadêmico de Jerusalém, Zeev Sternhell, escreveu sobre os últimos acontecimentos, que “a  ocupação continuará, será confiscada a terra aos seus proprietários para ampliar os colonatos, o Vale do Jordão será limpo de árabes, a Jerusalém árabe ficará estrangulada pelos bairros judeus, e qualquer ato de roubo e insensatez que seja útil para a expansão judia na cidade será bem recebido pelo Tribunal Supremo de Justiça. Está aberto o caminho para o apartheid, e não será barrado até que o mundo ocidental coloque Israel perante uma escolha inequívoca: ou se põe fim à anexação e se desmantelam os colonatos e o estado dos colonos ou será isolado”.

De Cambridge, onde é professor emérito de linguística e filosofia no Instituto Tecnológico de Massachusetts, Noam Chomsky relatou a insatisfação dos israelenses, que realizaram manifestações em 11 cidades do país contra a ofensiva e em defesa do reconhecimento do Estado palestino:

"Na Cisjordânia, Israel continuará a apropriar-se daquilo que considere valioso — água, terra, recursos — dispersando a limitada população palestina, ao mesmo tempo que integra estas aquisições no Grande Israel. Nele inclui-se a “Jerusalém” enormemente ampliada que Israel anexou, violando os preceitos do Conselho de Segurança, tudo o que há no lado israelita do muro de separação ilegal, os canais a Leste que criam cantões palestinos inviáveis, o Vale do Jordão, de onde de forma sistemática se expulsam os palestinos e se estabelecem colonatos, e os enormes projetos de infra-estruturas que unem todas estas aquisições a Israel propriamente dito".

"O caminho não leva à África do Sul, mas a um aumento da proporção de judeus no Grande Israel que está a ser edificado. Esta é a alternativa oposta a um acordo sobre dois estados. Não há razão para esperar que Israel aceite um Estado palestino que não deseja".

Intelectuais e artistas israelenses têm sofrido represálias por se operem à guerra.  A primeira a pagar o preço foi a atriz Orna Banai, uma das mais famosas comediantes do país. Em entrevista, ela disse estar envergonhada por causa do número de mortos civis entre os palestinos da Faixa de Gaza. Resultado: perdeu uma campanha publicitária milionária de uma empresa de turismo.

"Todos sofrem com essa situação, tanto nós quanto eles (os palestinos) e do lado deles morreram hoje mulheres e crianças e isso me entristece muito", disse Orna, a um canal de TV israelense, acentuando: "Basta que você diga que quer paz e já te atacam. Me dói que morram entre eles civis. Mas parece que em tempo de guerra você tem que ser solidário e dizer apenas vamos vencer, vamos vencer. Não posso dizer isso".

Orna Banai: uma voz contra a guerra
Orna Banai não foi a única a sofrer com o patrulhamento. A cineasta Shira Geffen, por exemplo, apelou publicamente por um cessar-fogo num abaixo assinado do qual participam diversos diretores. O grupo foi criticado pela ministra da Cultura, Limor Livnat, que o chamou de "desgraça do Estado de Israel". Geffen também leu os nomes de quatro crianças mortas em Gaza durante a estréia de seu mais recente filme e pediu um minuto de silêncio à plateia.

"O fato de expressar empatia por quatro meninos mortos atrai tantas respostas violentas e odiosas que mostra como nossa sociedade afundou. Gostaria de sair do armário: quando uma criança é morta dói, não importa se ela era israelense ou palestina, de Ashkelon ou Gaza", escreveu Shira em sua página do Facebook.

Outra artista que se tornou alvo de críticas é a cantora Achinoam Nini, conhecida como Noa. Num de seus shows na semana passada, na Espanha, ela fez questão de discursar sobre a situação:

"Estamos pagando o preço pelo fracasso e a covardia de líderes políticos e religiosos, que nos traíram, tanto árabes e judeus, por não fazer de tudo para evitar a violência. Nenhuma desculpa é aceitável" disse ela.

Apesar das represálias, muitos saúdam a coragem das artistas que fogem do entendimento oficial amplamente apoiado. Em artigo no jornal Haaretz, o ex-ministro Yossi Sarid escreveu: "Nossos agradecimentos a muitas mulheres e homens que abriram mão do direito de ficarem em silêncio e cumpriram seu dever para com o Estado e a sociedade".

Eu vi com meus próprios olhos: os "falcões" radicalizam cada vez mais

Milhares de israelenses foram as ruas pedindo acordo de paz
Quando estive na região em 2002 percebi o desconforto cada vez maior de muitos israelenses com o ambiente belicoso. Jovens preferiam a cadeia a servirem ao Exército, que sitiava Ramalah, sede da Autoridade Nacional Palestina.  E dois grandes movimentos pacifistas ganhavam as ruas, o Gush Shalom e o Peace Now.  Com meu colega Rubens Andrade, tentamos ir a Ramalah, mas só foi possível chegar a Jericó, onde encontramos o ministro Saeb Erakat, negociador palestino.

Em Telavive e Jerusalém os pacifistas não tinham muitas esperanças devido ao fluxo de migrantes orientais, que traziam uma grande carga de radicalismo e estavam de olho nos novos assentamentos. No norte de Israel, onde existem 70 municípios de população árabe, o pessimismo também era grande. O governo havia baixado decreto proibindo os não judeus de adquirirem propriedades, enquanto mantinha as prefeituras locais sem recursos do orçamento nacional. Em abril de 2002, Israel declarou que a Cisjordânia e a Faixa de Gaza seriam repartidas em oito áreas principais, entre as quais os palestinos não poderiam se mover sem sua permissão.

Bombardeios não poupam nem escolas, 
nem hospitais

Escola destruída em Gaza servia de abrigo à população civil

Todo esse fermento explosivo torna crônica e cada vez mais cruel a utilização do poderio bélico, cada vez mais sofisticado, com o extermínio de populações civis, vistas como aliadas do Hamas. Nestes dias, em que se contabilizam 796 vítimas civis, entre as quais 170 crianças, os bombardeios não poupam nem escolas e hospitais. Hoje, dia 24, 15 pessoas morreram e outras 200 ficaram feridas num ataque a  uma escola das Nações Unidas em Beit Hanoun, no Norte da Faixa de Gaza. 

Mais cedo, a Agência da ONU para os Refugiados Palestinos havia publicado em sua conta no Twitter que outra instituição de ensino, em Deir Al Balah, foi atingida por um bombardeio e cinco pessoas teriam ficado feridas. Na quarta, forças israelenses haviam lançado bombas sobre o Hospital Wafa, alegando que o Hamas estava disparando foguetes de lá. Fazem pouco mais de 15 dias da nova ofensiva: em 2009, foram mortos 1.300 civis.

A chefa humanitária da ONU na área, Valerie Amos, manifestou extrema preocupação com a situação na Faixa de Gaza, e ressaltou que um cessar-fogo é “vital”. Segundo ela, 44% do território palestino foi declarado zona proibida pelo exército israelense,e “não restam muitos locais para onde as pessoas possam ir”. Além disso, a coordenadora ressaltou que os moradores estão ficando sem comida.

— Temos mais de 118 mil pessoas abrigadas (já chegam a 130 mil), em 86 escolas da ONU no momento. As pessoas estão ficando sem comida, e a água também é uma preocupação séria — destacou Valerie, acrescentando que a situação em Gaza é “terrível”. — O trauma que estão vivendo é terrível. Nos dois últimos dias, uma criança morreu a cada hora. Todos deveríamos nos sentar por um momento e pensar nisso — declarou a funcionária da ONU.

Armas químicas contra palestinos em Gaza

Veja denúncia sobre uso de armas químicas nos bombardeios

Nenhum comentário:

Postar um comentário