Uma radiografia da manipulação
Escrito por: Luciano Martins Costa
Fonte: Observatório da Imprensa
Fonte: Observatório da Imprensa
O eixo das manipulações vai de alto a baixo, em todas as instâncias onde esteja no poder o partido que lidera a aliança governamental em Brasília
Educadores que participaram, na terça-feira (29/4), do debate na sede
da Ação Educativa, em São Paulo, questionam por que este observador
considera que a mídia tradicional do Brasil apoia e potencializa a
agenda conservadora que segue tramitando em velocidade anormal na Câmara
dos Deputados (ver aqui).
De fato, não basta registrar que os parlamentares afinados com o
ideário mais retrógrado na diversidade do Congresso aproveitam a crise
política insuflada e sustentada pela imprensa para fazer o Brasil
avançar rumo ao passado. É preciso mostrar como, na prática, a mídia faz
esse trabalho sujo.
Nas edições de sexta-feira (1/5), os jornais destacam o fato de a
presidente da República, que foi sitiada em Brasília desde sua eleição,
em dezembro, ter optado por não se pronunciar na televisão por ocasião
do Dia do Trabalho. A presidente se omite para evitar se expor a essa
situação estimulada pela imprensa diariamente. No limite da
governabilidade, a jovem democracia brasileira enfrenta seu maior
desafio desde o fim da ditadura militar, e corre o risco de ver crescer
uma onda de retrocesso institucional, à sombra desse protagonismo da
mídia.
Há muitos aspectos a serem considerados nesta encruzilhada da vida
nacional. Por exemplo, o fato de a aliança que governa o país contar
entre seus aliados com a bancada do Partido Progressista, cujo nome é um
acinte ao sentido real da sua representação política. No programa
gratuito da sigla, quinta-feira (30/5) à noite, o que se ouviu sobre a
proposta de redução da maioridade penal foi um despautério de bobagens,
no estilo típico dos programas policialescos da televisão. O credo
reacionário desses aliados do governo petista pode ser resumido na
seguinte frase, dita em tal programa: “As leis garantem direitos
demais”.
Com tais amigos, o governo federal realmente não precisa de oposição.
Mas a situação é ainda pior na porção maior da base controlada pelo
PMDB, que se dividiu em três facções, duas das quais, sob o comando do
presidente do Senado, Renan Calheiros, e do presidente da Câmara dos
Deputados, Eduardo Cunha, desdenham da liderança do articulador político
do governo, o vice-presidente Michel Temer.
Dano colateral
A imprensa explora esses desentendimentos, dando amplo destaque a
qualquer coisa que digam Calheiros e Cunha, desde que represente algum
desgaste do Executivo. O jornalismo declaratório é colocado a serviço
desse processo que desgasta não apenas a imagem do Executivo, mas
principalmente desacredita o Parlamento e a própria política. Esse
cenário estimula as vozes do obscurantismo, que ainda pedem a volta da
ditadura militar.
O eixo das manipulações vai de alto a baixo, em todas as instâncias
onde esteja no poder o partido que lidera a aliança governamental em
Brasília: na sexta-feira, por exemplo, a Folha de S. Paulo oferece como
manchete uma bobagem retirada do noticiário sobre um dos corriqueiros
conflitos na região da capital paulista conhecida como Cracolândia. O
ataque da polícia do Paraná contra servidores públicos, que deixou mais
de 200 feridos, sumiu da primeira página, substituído pelo seguinte
título: “Gestão Haddad falou com tráfico antes de agir na cracolândia”.
Embora um editorial da Folha, com o título “Os excessos de Richa”,
critique a violência policial no Paraná, o jornal paulista cria um
factoide em cima da prática rotineira de funcionários da prefeitura de
São Paulo ao negociar o ingresso em um ambiente de alto risco como é a
Cracolândia.
Ora, este observador já havia publicado, em pelo menos duas ocasiões,
que reina naquela região um pacto silencioso entre agentes públicos,
voluntários e representantes do crime organizado para manter sob
controle a venda de crack aos dependentes (ver aqui e aqui).
Observa-se que, toda vez que, em algum lugar do Brasil, um político da
oposição apoiada pela imprensa se coloca em situação constrangedora, os
jornais tratam de contrapor o fato a algum evento envolvendo políticos
do Partido dos Trabalhadores ou seus aliados. Assim, o contexto negativo
que envolve o governador tucano do Paraná é coberto por um factoide
criado pela Folha para atingir o prefeito petista de São Paulo.
O que há por trás da manchete da Folha é o mesmo jogo pelo qual a mídia
tradicional trata de demonizar um lado do espectro político, enquanto
protege ou enaltece o outro lado. O fato de que essa manipulação
estimula o avanço de projetos que podem jogar o Brasil de volta ao
século 19 é considerado apenas um dano colateral nessa luta pelo poder.
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