quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Mensalão: A Verdade Vem à Tona

Com a descrição, capaz de atravessar duas sessões no julgamento do mensalão, de práticas bancárias que fazem o ministro-revisor pedir a condenação de quatro dirigentes do Banco Rural, uma pergunta se impõe: o setor de Fiscalização do Banco Central não viu nada, outra vez, que justificasse providências efetivas? Ou seja, capazes de sustar em tempo as operações anormais e suas consequências para o país?
O Banco Nacional, o Santos, tantos outros mais, estouraram um atrás do outro, pipocas financeiras, porque a fiscalização do BC não detectou as ilegalidades que cometeram por anos e anos. Ou constatou e não agiu.
Como o caso do Nacional atingia relações e interesses especiais, a cúpula do governo Fernando Henrique Cardoso varou certa madrugada e dela saiu com a criação do Proer, uma cobertura financeira do estouro, claro, com dinheiro alheio.
Apesar dos muitos crimes financeiros que foi impossível esconder, o Ministério Público de então, conduzido pelo engavetador-geral Geraldo Brindeiro, deixou as vias livres para que os responsáveis maiores pelo Nacional --seus diretores-proprietários-- chegassem livres e muito bem aos dias de hoje.
Os dirigentes do Rural encontraram recepção diferente para os seus feitos e não feitos. Mas o Banco Central não mudou.
A engenharia financeira que associou Marcos Valério e o Rural tornou-se ativa pelo menos em 1998, com o chamado mensalão do PSDB, para beneficiar a candidatura (derrotada) de Eduardo Azeredo ao governo mineiro. Nenhum ato do BC tentou sustá-la.
Transposta do PSDB para o PT, a engenharia Valério/Rural deixou mais seis anos de anomalias para a fiscalização do BC. Em vão.
Cada ponto da acusação a práticas do Banco Rural é, portanto, acusação não feita, mas devida, ao Banco Central, que ficou, no caso, entre ser relapso e passar-se como tal por improbidade. Sem investigação a respeito, sem sequer uma referência, no julgamento, à omissão que contribuiu para a ocorrência do segundo esquema Valério/Rural, por permitir o primeiro.
IMÓVEL
A invasão, por lavradores, de terra improdutiva mobiliza destacamentos policiais armados e violentos para desalojá-los.
Até o Exército já foi lançado em operação do gênero.
Mas o governo federal não é capaz de se entender para restituir ao Jardim Botânico, no Rio, área invadida que é indispensável para o crescimento de seu acervo natural e para as pesquisas científicas de que é um campo extraordinário.
Já foi proposta a oferta de moradia, por certo mais decente do que a maioria das moradias invasoras, e a demagogia em nome do social não cedeu. Nem provocou alguém com autoridade bastante para impor o bom senso em nome do interesse social verdadeiro.
NO LUCRO
O Brasil é sócio da ditadura, disfarçada por fraudes eleitorais, e da corrupção gigantesca que asseguraram, agora, sua continuidade em Angola.
Sociedade que vem de longe: minas de diamante em Angola foram a escolha de Paulo César Farias para aplicar, em sigilo, a dinheirama inconfessável que administrava.

...
 
Outras peculiaridades, além das dimensões e da fartura de condenações, confirmam o peso histórico atribuído com antecedência ao chamado julgamento do mensalão, também referido com frequente ironia como ação penal 470.

É possível que já houvesse, entre os julgadores e entre os julgados, personagens mais cedo ou mais tarde destinados à história, e outros aos buracos de todas as memórias. O julgamento igualou-os, mas ficou a injusta recusa a três pessoas de passarem também à história.

Documentos comprovam as assinaturas e rubricas de quatro representantes do Banco do Brasil, dois diretores e dois gerentes executivos, nas transações com a DNA de Marcos Valério em torno da Visanet. Incluído na ação penal 470, porém, foi um só. Os três restantes foram deixados para processo comum, de primeira instância, com direito a todos os recursos às instâncias superiores, se condenados, e demandas de defesa. Ou seja, possibilidade de sucessivas defesas e múltiplos julgamentos. Direito não reconhecido aos julgados no Supremo Tribunal Federal, por ser instância única.

Os três barrados da história têm em comum o fato de que já estavam nos cargos de confiança durante o governo Fernando Henrique, neles sendo mantidos pelo governo Lula. E, em comum com o condenado pelo STF, terem os quatro sempre assinado em conjunto, por norma do BB, todas as decisões e medidas relativas ao fundo Visanet. Dado que uma das peculiaridades do julgamento foi o valor especial das ilações e deduções, para efeito condenatório, ficou liberada, para quem quiser, a inquietante dedução de tratamento discriminatório e político, com inclusão nas durezas do STF apenas do diretor definido como originário do PT.

O benefício desfrutado pelos três não foi criado pelo relator Joaquim Barbosa, que o encontrou já na peça de acusação apresentada pelo procurador-geral Roberto Gurgel, e o adotou. Um dentre numerosos problemas, sobretudo quanto a provas. Por exemplo, como registrado a certa altura do julgamento nas palavras bem dosadas de Marcelo Coelho:

"O ponto polêmico, na verdade, recai sobre a qualidade das provas para incriminar José Dirceu. Não houve nenhum e-mail, nenhuma transcrição de conversa telefônica, nenhuma filmagem, provando claramente que ele deu ordens a Delúbio Soares para corromper parlamentares".

A condenação de José Dirceu está apoiada por motivos políticos. E, à falta das provas cabais para condenação penal, forçosamente originada de motivações políticas. Bastará, no futuro histórico do julgamento, para caracterizá-lo como essencialmente político. Caracterização que se reforça, desde logo, pelo tratamento amigável concedido ao mensalão precursor, o do PSDB, de 1998 e há 14 anos acomodado no sono judicial.

E caracterização outra vez reforçada pela incontinência do procurador-geral Roberto Gurgel, com seu pedido de prisão imediata dos réus condenados sem que representem perigo e sem que o processo haja tramitado em julgado. A busca de "efetividade" da ação judicial, invocada pelo procurador-geral para o pedido negado por Joaquim Barbosa, ficaria muito bem no caso em que se omitiu, com explicação tardia e insuficiente.

Houvesse, então, o apego à efetividade, o Ministério Público estaria em condições de evitar a enrolação de negociatas que usa Carlos Cachoeira como eixo, inclusive no Congresso.

No primeiro dia do julgamento, o relator chamou o revisor de "desleal", por manter a opinião que o relator abandonou. No segundo, o revisor foi posto pelo relator sob a insinuação de ser advogado de defesa do principal acusado, Marcos Valério. E de destrato em destrato até o fim, o julgamento criou mais uma inovação inesperada para destacá-lo nos anais.

Jânio de Freitas (folha de são paulo - 23/12/2012)

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